As democracias ocidentais, regra geral, não são semi-presidenciais. Há um governo que governa e um chefe de Estado que o nomeia e pouco mais. O semi-presidencialismo português tem raízes históricas que é preciso entender, algumas remontando a 1910, mas a maior parte remontando aos inícios da democratização pós-1974. Com dúvidas sobre a força futura de partidos então recentemente criados e do sistema parlamentar, era preciso um garante superior, com a legitimidade dada por voto directo, que não deixasse o processo descambar. Eanes, no seu primeiro mandato, cumpriu seguramente essa função, mas cedo se percebeu que havia excesso de poder presidencial. A revisão constitucional de 1982 diminuiu-o um pouco, mas não chegou para tornar o regime mais normalmente europeu. Desde o segundo mandado de Eanes, os presidentes pouco fizeram. Ou mesmo nada. Têm uma máquina gigantesca e cara - particularmente gigantesca e particularmente cara com Cavaco Silva - e fazem o que um presidente mais modesto podia fazer, caso por cá fosse um pouco mais europeu. Mas não é. E dificilmente será, porque a mudança implica uma virtualmente impossível revisão constitucional, pois os partidos que têm a presidência dificilmente a querem. O erro da Constituição de 1976 foi não ter previsto um carácter transitório para o semi-presidencialismo. Não sei como isso seria feito, mas todos sabemos que o constitucionalismo é plástico e dá para muito. Assim, teremos de ser diferentes por muito tempo. Mas podemos também viver bem com a diferença. Desde que haja um presidente à altura. Alguém alguma vez pode acreditar que Rebelo de Sousa que sempre tanto quis mandar e nunca conseguiu passar de ministro irá ser um Presidente calmo e sereno, como é preciso? O único mote da sua campanha, ao que parece, é o de defender pontes e consensos. Alguém acredita que não andará sempre a querer manipular num sentido ou no outro? Que não estará sempre a dizer o sim e o seu contrário? Temos tido provas disso, nos dias mais recentes. E com pouca bagagem intelectual, de tal forma que há anos que não tem um livro com as suas "opiniões", de tão voláteis que são. E alguém acredita que não será o porta-voz dos deserdados do cavaquismo? Precisamos de nova vida mesmo. E só um candidato, quanto a mim, consegue isso: o óbvio. Essa nova vida é a de um Presidente que presida e esteja atento, mas que não ande à busca de "soluções" governativas, à cata de ideias para comentar. Mas vai ser difícil. Um país que durante anos parou para ouvir sermões políticos abstractos e pouco coerentes, como todos estão a descobrir agora, é um país mais longe da Europa que importa. Com Rebelo de Sousa na presidência, longe continuará. Pode ser uma excelente pessoa, mas dificilmente será o Presidente de que precisamos. Isto, claro, não esquecendo que no resto do continente há coisas iguais ou mesmo piores. Mas este país já deu vários exemplos e não era mau dar mais um. E no Reino da Dinamarca também não há Rebelos de Sousa.
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