As ideias andam por aí e é preciso ter algum cuidado. Francesco Giavazzi, economista reputado e obviamente competente, foi um dos principais mentores da ideia da "austeridade expansionista", tendo publicado vários artigos sobre o assunto, até chegar a uma versão em que conclui, com os seus co-autores, que, afinal, são os "ajustamentos" pelo lado da despesa que não causam recessão, ao contrário dos ajustamentos pelo lado da receita. Trata-se da discussão, agora velha, sobre os "multiplicadores", isto é, sobre os efeitos de uma redução rápida do défice público no crescimento económico. Tudo isto foi sujeito a confirmação prática, na crise que atravessamos, e os resultados estão à vista. Tão à vista que as cúpulas das organizações internacionais, que em tempos compraram essa ideia, como o FMI, estão a rever a sua utilização, espera-se que não apenas temporariamente. Mas já há muito que muitos sabiam que havia problemas com estas ideias, incluindo, por exemplo, alguém que olhou mais de perto para o caso supostamente exemplar da Suécia em que, ao que parece, a coisa foi bem mais complexa do que aparece nos estudos de Giavazzi e companhia. Mas não é tudo. É preciso olhar para a forma que toma esta corrente de pensamento quando expressa em linguagem corrente, de opinião publicada em jornais, e aí ainda há lugar para surpresas. No fundo, são ideias que se traduzem em muito pouco, quando utilizadas na observação terrena. Nestes dias, Giavazzi publicou um artigo de opinião no FT com o seguinte título: "Greeks chose poverty, let them have their way". Fui ver, procurando a ironia da frase, mas era a sério. O autor afirma mesmo isto: "It is pretty clear that the Greeks have no appetite for modernising their society. They worry too little about an economy ruined by patronage." Ou seja, os "gregos" não querem "modernizar" a economia, antiquada e corrupta, e "devemos" aceitar isso. Giavazzi revela aquela que seria a solução de tudo, assim: "Without economic and social reforms, Greece will remain a relatively poor country." Como se escreve isto, com tanta facilidade? A resposta é simples. Em primeiro lugar, não há outra forma de compreender o que se passa quando se pensa que se tem a solução mágica para os problemas (a tal consolidação virtuosa): se sabemos como crescer, pensa quem assim pensa, só não cresce quem não quer (ou é culturalmente inferior); em segundo lugar, há uma enorme ignorância sobre as lições que gerações de economistas e historiadores económicos têm aprendido com a observação das experiências passadas, que mostram quão complexas são as causas do crescimento, incluindo um vasto leque de factores - em que os défices e as dívidas dos Estados não são mais do que gotas de água. Enfim, ideias são ideias e o debate de ideias ganha sempre pelo menos um pouco com todas. Mas difícil mesmo é perceber como houve governos que compraram estas ideias de forma tão convicta. Presentemente, até o actual Governo português, que foi um dos grandes compradores, está arrependido - embora seja um mero arrependimento de circunstância eleitoral.
PS: Outra crítica, com dados e indignação acrescida.
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