Parece impossível mas também parece verdade: a mais importante reforma institucional de que o país precisa é a do ministro das Finanças. Mas é simples: é preciso que ele tenha menos poder. É o que se pode concluir da leitura de um relatório do CEPR, intitulado Public Debts: Nuts, Bolts and Worries, de que foi um dos autores, com Barry Eichengreen, entre outros, um dos membros do Conselho Superior das Finanças Públicas, Jürgen von Hagen. A escolha deste economista alemão para aquele conselho deve ser saudada vivamente, ao contrário do facto de ainda não ser ter visto nada quanto à acção do mesmo. Mas talvez ainda seja cedo e aguardemos por melhores dias quanto a isso. O relatório em causa é extremamente interessante porque coloca o problema da escalada das dívidas públicas na Europa, nos EUA e no Japão numa perspectiva de longo prazo. Mostra as origens do problema, a necessidade da sua solução, e dá algumas contribuições para alguns caminhos, com alertas pelo meio. Na Europa, as origens do problema são remotas, estando relacionadas com o aumento das transferências sociais e, mais recentemente, com os aumentos dos défices para colmatar a crise financeira iniciada em 2008. A necessidade da solução é enorme, pois as trajectórias são insustentáveis. Nada disto é muito novo. Mas há algo de novo quanto a Portugal. O primeiro facto novo é que estimam que a parte "cíclica" do aumento da dívida entre 2007 e 2011 foi mais de metade do total, como aconteceu com Espanha, Grécia e Irlanda e ao contrário dos demais países da zona euro. Também por cá os custos de salvamento de bancos estiveram aquém do que aconteceu nos outros três PIrGS (p. 54). É economia, não é política. A segunda coisa nova, é que o "nosso" problema é menos grave do que em muitas outras partes da Europa. Senão vejamos: uma parte considerável do futuro aumento da dívida nacional decorrerá das transferências relacionadas com o aumento da esperança de vida. Todavia, o relatório estima que isso terá um impacto de apenas 2% do PIB, entre 2007 e 2035, um dos mais baixos da Europa e muito abaixo, mais uma vez, dos outros PIrGS. Curiosamente, os mais elevados são a Grécia (aprox.9%) e os Países Baixos (aprox.7%) (p. 52). Postas as coisas em perspectiva, o que fazer? É preciso reduzir a despesa, mais do que aumentar os impostos, é uma das recomendações. Mas, para o fazer de modo eficaz, são necessárias duas transformações institucionais: criar um conselho superior de finanças públicas independente e com poderes; e, atendendo a que Portugal tem um governo de coligação, instaurar um sistema de negociação do orçamento do Estado em que a negociação da despesa é "contratada" entre os vários ministros, e não concentrada e delegada no ministro das Finanças (pp. 25 e segs.). Não é fácil resumir o relatório, e este é um dos resumos possíveis. Muita coisa fica de fora que não dispensa a sua leitura, nem que seja em diagonal. Uma das coisas mais importantes que fica aqui de fora é como que um pedido que os autores fazem ao BCE para que permita alguma inflação, para ajudar à redução da dívida real (PP. 62 e segs.). Não é uma solução cabal, mas aligeira os efeitos da redução do défice através da diminuição da despesa a qual, dizem os autores, só é eficaz se não afectar demasiadamente o denominador, o PIB. Outra é que acham que o limite constitucional ao défice de pouco serve, segundo as experiências históricas existentes (p. 22). O relatório pode ser visto aqui e aqui fica o meu exemplar com sublinhados que podem facilitar a sua leitura.
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