Todos sabemos um pouco de crescimento económico. Por exemplo, todos sabemos discutir as décimas que nos separam da convergência. "A Europa cresceu a 3% ao ano e nós apenas 2,5%? Então, temos um problema." Esta frase, que denota alguma intuição sobre o que vale 0,5, podia ser dita por muita gente. Todavia, quando se fala nas obras públicas que os governos deste país têm em programa desde os tempos de Guterres, Barroso e Santana e agora com Sócrates, aquilo de que se fala é de milhares de milhões de euros. E são as pessoas mais proficientes em matérias económicas e financeiras (embora não necessariamente em matérias de crescimento) que falam assim. Num post anterior a este citei um economista que dizia que as obras públicas programadas iriam custar 30 mil milhões de euros. Mas o que é que isso significa? Simples, diz-nos o mesmo economista, significa 12% do PIB nacional de 2008. Peguemos nesse número que inclui tudo o que é possível incluir e olhemos mais de perto com a ajuda de um pertinente comentário que foi feito a esse post. Comparar um investimento que será feito ao longo de vários anos com o PIB de um ano é errado. Não se devem comparar stocks com fluxos, todos sabemos isso. Quando se faz uma comparação do género, mostra-se uma dimensão "grande" mas perde-se a proporção. É preciso comparar o investimento anual com o PIB anual. Ora 30 mil milhões serão gastos em, digamos, 5 anos (serão mais anos, muitos mais, mas não faz mal, até porque depois os valores vão subir). 30 a dividir por 5 dá 6 mil milhões, ou seja 2,4% do PIB de 2008. Se supusermos que o PIB não cresce entre 2008 e 2013, aquela proporção manter-se-á. Se crescer, diminuirá, claro. Conclusão, as "grandes obras públicas" vão afinal custar 2,4% do PIB em cada ano, nos próximos 5 anos. A percepção sobre as mesmas torna-se diferente, não torna? Note-se que tudo aquilo é investimento. Pode ser mau (não é) ou bom (é) mas é investimento. Quanto investe uma economia por ano? Digamos que devia investir pelo menos 25% do PIB. Assim, continuando nestas contas, as "grandes obras" corresponderão a 10% de todo o investimento nacional. Not bad. (o investimento em Portugal está abaixo dos 25% do PIB, porque, entre outras coisas, o "Monstro" não tem investido suficientemente). Mas ainda não chega de contas. Alguém estimou que a dívida para se investir nas obras públicas em carteira levará a encargos de 0,6% do PIB. Isso é muito? Para mim não é. Se, por exemplo, fosse tudo pago pelo orçamento do Estado (que não é) eu até gostaria de um acréscimo desse montante no défice público nacional tendo como objectivo financiar tais obras. Mas aquela conta é ainda incompleta, pois não tem em consideração que parte dos fundos vão ser dados pela União Europeia (lá sabe-se melhor do que cá o que estas coisas valem, parece); que uma parte do financiamento será feita pelo Banco Europeu de Investimentos a taxas mais baixas; e que apesar de tudo estes investimentos vão dar retorno. Não consigo contabilizar estes efeitos aqui, mas seguramente eles vão reduzir aqueles 0,6% a 0,5 ou 0,4%. Portugal tem dinheiro para pagar isso. Todo o Portugal, visto como uma economia, isto é. São projectos nacionais e a nação, como um todo, já tem dinheiro para ter um novo aeroporto e um TGV do Porto, a Lisboa, a Madrid. Não percebo como é que se pode pensar de outro modo. Mas pensa-se. Gostava de conseguir explicar isso. Há várias explicações possíveis, mas nenhuma me satisfaz. Também pode ser que eu não esteja mesmo a ver bem a coisa. Caso isso assim seja, preferia que me explicassem melhor com base em valores anuais em percentagem do PIB, e não com base em biliões.
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