Tenho andado a pensar o que dizer para dizer que não faz muito sentido falar na redução dos salários nominais como solução para o nosso "problema". Há um bom argumento dado por Nuno Teles aqui ("a culpa é da inflação"), mas talvez ainda possa acrescentar quatro coisas. A primeira é que estamos a falar da redução dos salários nominais e não dos salários reais. Ou seja, da redução do que as pessoas são pagas cada ano, independentemente da inflação. Quem ganhasse 100, passaria a ganhar 80. A segunda é que acho muito estranho que Silva Lopes alguma vez tenha defendido isso. Ele sempre defendeu o controle dos custos com a redução dos salários reais, isto é, dando aumentos salariais abaixo da inflação. Algo que sempre procurou alcançar quando foi presidente do Conselho de Concertação Social. Uma terceira coisa é que uma "lei" que obrigasse à redução geral dos salários nominais de, digamos, 20% (que é o que é necessário segundo Olivier Blanchard estimou há um ano ou dois) funcionaria como proteccionismo ao contrário. Essa "lei" trataria todos por igual e não contribuiria para o favorecimento dos sectores mais produtivos, que é precisamente o que o proteccionismo também não faz. Depois teria consequências negativas de médio prazo, uma vez que os salários teriam de convergir novamente para os níveis dos parceiros do Euro, que é precisamente o mesmo problema do proteccionismo (não estou totalmente certo deste argumento, todavia). Finalmente, a redução de salários nominais atrasaria a transformação estrutural da economia portuguesa, pelas razões óbvias. A economia portuguesa há-de lá ir sem medidas drásticas, sobretudo sem medidas drásticas que atrasem a transformação estrutural de que a economia precisa, como essa de mexer nos salários nominais ou a protecção perante a concorrência externa.
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